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segunda-feira, 31 de maio de 2010

IV CNCT&I: um balanço ácido


Na semana passada ocorreu em Brasília a IV Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação. O evento teve lugar em hotel luxuoso. Foi hiper concorrido e quem quis comparecer in loco foi obrigado a estacionar longe do hotel e submeter-se a um caminhada light, bem luminosa, considerando o escaldante sol do cerrado. Minha observações, reconheço, são bem ácidas, infelizmente. Espero que as discordâncias e a ênfase de aspectos positivos sejam postadas nos comentários, com o intuito de minimizar os aspectos negativos que aponto aqui.


No fundo achei que foi puro marketing apesar de algumas boas falas. A maioria do que foi dito me pareceu o supra-sumo daquilo que é o nosso melhor produto científico: indicadores. Temos indicadores maravilhosos. Azar da realidade que não condiz com eles. Vi representantes de fundações de amparo à pesquisa estaduais semi-analfabetos falando que é preciso aproximar mais a ciência do mercado e a universidade da academia!!! Qual academia? Aquela do Oscar? Vi também pesquisadores sérios que colocaram sim o dedo na ferida e mostraram que nem tudo são flores e apresentaram ótimos anti-indicadores... Excelentes palestras. Pena que foram poucas e pena que não representaram a tônica geral do evento. Em  termos práticos não vi nada de vmuito concreto que apontasse para a superação das deficiências atuais. 

A impressão geral foi de um grande evento mais preocupado em ampliar os laços ciência-mercado do que em aprimorar as bases estruturais da ciência-ciência. Sem essa última a questão do mercado fica muito complicada.


Ouvi dizer que o custo do evento foi de mais de R$ 4 milhoes. Não sei se as cifras são mesmo essas, mas não vejo sentido algum em gastar dinheiro público, da C&T para "bombar" as inscrições, que não seja um forte apelo de marketing: tantos mil inscritos compareceram. Passei no evento na tarde do primeiro dia. Ainda estavam sendo feitas inscrições, apesar de não haver mais espaço para caminhar para as palestras. A sessão que escolhi para assistir tinha gente embolada na rua, na frente do hall que antecede o saguão sem conseguir entrar. Imaginei: nossa! a sessão está mesmo concorrida. Não era isso: a plenária estava semi vazia, porque tratava-se do mesmo local onde o presidente Lula faria 4hs mais tarde um discurso sobre nossa maravilhosa política de CT&I. Detectores de metais e outras medidas de segurança impediam o acesso dos interessados à plenária.


Vi também milhares de publicações (de excelente qualidade gráfica, e custo compatível com tal luxo) desesperadas para serem doadas. Publicações publicitárias de empresas governamentais que versavam sobre as maravilhosas realizações e projetos em CT&I, Não pude deixar de pensar em como é difícil manter boas revistas científicas no Brasil e em quão dispendioso é publicar, em papel, tais revistas. O alto custo da edição tem sido, há muito tempo, o calcanhar de Aquiles que atrasa e, muitas vezes, derruba bons projetos editoriais. 

Além de uma bolsa de lona, com um desing maravilhoso (será excelente para transportar meu material da aula de metodologia), ganhei também um "voucher vale-lanche". Como, em função das dificuldades de acesso às plenárias, voltei para casa para assistir a conferência via web, não pude degustar a iguaria gourmet.


O fato é que muito pouco se discutiu sobre ciência, no sentido da troca e debate de idéias (comunicação "n" para "n") . Um pouco foi dito sobre ciência por renomados cientistas, porém de modo unilateral (comunicação um para "n"). Muito se falou sobre indicadores e sobre o maravilhoso patamar atual por ilustres ocupantes de cargos, alheios aos fundamentos da ciência (comunicação "blá-blá-blá", ou "n" para zero).

Vamos ver o que os leitores do blog acharam do evento...

5 comentários:

  1. Vamos lá... qual é o propósito de uma conferência?? "Uma conferência de determinada política pública tem o objetivo de verificar como está o desenvolvimento desta política no âmbito local, estadual e nacional." Previamente à IV CNCTI, tivemos as conferências municipais (poucas, creio eu), as estaduais (será que eu todos os estados?) e as reginais (em todas as regiões do país), como podemos verificar no site da CGEE... Idealmente as conferências deveriam ser periódicas e, em 25 anos, essa foi a quarta edição... da primeira para a segunda foram 16 anos de espera... por isso, não obstante aos comentários postados, eu acredito sim, que a ciência e tecnologia avançou nestes 25 anos... o ideal ainda está longe e acho válidas todas as críticas, pois os avanços só ocorrem dessa forma mesmo... Entretanto, temos que olhar pra frente... talvez seja mais produtivo para a C&T ressaltar e trabalhar as boas falas, as boas ideias, mesmo que a princípio sejam consideradas poucas... afinal, falar em MKT em ano político é chover no molhado, não é mesmo? Pulemos esta parte e vamos nos concentrar na melhoria do ensino, da ciência e da tecnologia... sugiro um debate sobre a contradição entre o importância da educação, dos cursos lato e stricto sensu, aclamados em vários discursos na IV CNCTI e a falta de respeito aos docentes e funcionários das universidades... como fazer ciência dessa forma?

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  2. Caro Profº André
    Não vou concordar totalmente com seus comentários "ácidos" apesar de reconhecer que são procedentes e em contexto geral, pertinentes. Mas vamos lá, é melhor ter eventos sobre ciência, tecnologia e inovação mesmo precários sob aspecto de conteúdo, do que não tê-los, o fato é que o assunto CTI está em pauta e isso já faz muita diferença em um país em desenvolvimento como o Brasil, as instituições aprenderão com a prática a planejar e gerenciar eventos que possam funcionar efetivamente como indutores de mudanças, promotores de políticas em CTI, projetos, etc...Lá no evento empresas e organizações expuseram suas iniciativas em CTI, talvez no próximo ano, tenham já o compromisso de mostrar algo diferente, avanços... e essa perspectiva vai então formando "massa crítica" em CTI, não é o ideal, nos deixa com certa ansiedade pois afinal o investimento foi alto, mas tenhamos paciência e constância de propósitos, os avanços virão. - Ah! me permitam por favor uma "defesa", sei que estará um pouquinho fora de nosso contexto de CI mas, por favor,peço licença para alertá-los, não vamos depreciar o conceito de marketing, marketing é antes de tudo "um processo social e gerencial no qual indivíduos e grupos obtem o que necessitam e desejam por meio da criação, oferta e troca de produtos de Valor." (Philip Kotler). Então, sobre o evento, sugiro usarem outro termo para adjetivar um uso meramente "promocional" de tempo, espaço, organizações e pessoas para se debater a CTI. Talvez, o termo "promoção vazia" caiba aí, ao invés de dizer que o evento foi "puro marketing" marketing é gestão é processo, é uma área do conhecimento dotada de instrumentos e conteúdos técnicos para gestão de negócios. :-) Obrigada ! Ainda sobre o evento CNCTI baixei do site dois textos sobre propriedade intelectual e informática para o desenvolvimento social que estou analisando. Em breve comentário é isso. Abraços a todos Andréa Guimarães Nunes.

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  3. Andréa,

    Quase concordo com você. O problema é de ordem de grandeza, já que esse tipo de "promoção" (não acho que tenha sido totalmente vazia) modifica a prioridade do investimento em CT&I. A questão não seria gastar o que se gastou se o gasto fosse um "também" e não um "invés de". Fazer um evento de tal porte enquanto às universidades estão à míngua parece o ditado do "comer mortadela e arrotar caviar".

    Também não vejo esse tipo de evento como formador de uma massa crítica, papel que, durante muito tempo foi ocupado pelos congressos da SBPC. A perspectiva "chapa branca", presente até mesmo nas boas críticas feitas à atual política de CT&I bloqueia o debate, tão necessário para o desenvolvimento científico. Não foi um congresso, no sentido de discussão ou troca de idéias. Foi uma espécie de relatório oficial do que vem sendo feito. Realmente é inegável que estamos avançando muito e que é preciso prestar contas à comunidade científica, porém isso não pode ser mais importante do que a ciência em si e nem pode ser confundido enquanto tal.

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  4. Hoje li no jornal que o maior corte do orçamento 2011 será na pasta da Educação, sendo que os recursos relativos ao ensino fundamental estão garantidos na íntegra. Adivinhem onde será feito o buraco.

    Hoje recebi também informação sobre a cobertura da CAPES à CNCTI. O título é: "Experiências exitosas e modernização da pós-graduação são abordadas em evento nacional". Detalhe: a nota foi postada pela CAPES às 16:31, do último dia do evento, em um esforço real de chamar os cientistas para comparecerem ao debate, não resta dúvida. Quem quiser conferir se a nota da CAPES é tão sensacionalista quanto a manchete é só clicar aqui.

    Cada vez mais me sinto em um pesadelo kafikiano, em uma vitrine para "inglês ver"...

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  5. Olá pessoal,
    Assisti a algumas palestras da conferência pela internet e achei bastante interessantes. A palestra "A universidade brasileira, a pós-graduação e a pesquisa" abordou assuntos interessantes como:
    - a educação básica e principalmente o ensino do português e da matemática e também a proposta de educação básica em tempo integral, com a criação de centros comunitários;
    - ainda em relação à educação básica, fazer um reflexão do que se ensina e como se ensina;
    -a importância do Portal de periódicos da Capes, único no mundo;
    - o currículo Lattes elogiado pela revista Nature, a importância dos grupos de pesquisa na plataforma Lattes;
    -a importância da iniciação científica;
    - a importância do estímulo às instituições técnicas de ensino superior como mais uma alternativa de formação para os jovens;
    - a questão de permitir que os alunos migrem de um curso para o outro na universidade;
    - estímulo ao desenvolvimento da pesquis.
    Outras questões importantes foram discutidas.
    Na sexta-feira, fui in loco assistir a algumas das palestra. Nesse dia falou-se sobre inclusão social, responsabilidade social, temas do meu interesse.
    A Secretaria de Ciência e Tecnologia para a Inclusão Social (SECIS) órgão do MCT responsável pela inclusão social, apresentou seus projetos. Achei interessante a parte de inclusão digital, através da criação de Centros de Acesso a Tecnologia para a Inclusão Social (CATIS) e de telecentros com o objetivo de democratizar o uso da TICs.
    Vamos aguardar a publicação do livro azul que trará as conclusões e recomendações da conferência.

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