A UnB recentemente ratificou a necessidade de que os projetos científicos, a serem por ela assinados, devam obedecer estritamente (sic) à Instrução da Reitoria 01/2008, que disciplina (sic) a matéria.
Em tese não deveria haver nenhum grande problema quanto ao estabelecimento de princípios e rotinas para que a universidade melhor executasse uma de suas atividades-fim. A exigência de que o projeto apresente relevância acadêmica (sic) tampouco deveria ser tema controverso.
O nó da questão reside, porém, no julgamento de mérito (apreciação e aprovação - sic) por instâncias burocráticas, não constituídas para tal finalidade. Tais instâncias, a despeito de serem compostas por professores, não têm as qualidades científicas como requisito para a escolha dos membros. A qualificação é apenas administrativa e conjuntural (ser membro do departamento, ou ser indicado para o conselho ou câmara). Isso provoca os seguintes desdobramentos:
- o julgamento de mérito será efetuado por uma instância administrativa e não científica;
- não existem padrões uniformes e claros, posto que a UnB não definiu formulário e critérios para tal (cada instância faz como achar melhor);
- os pares que procederão ao julgamento de mérito necessariamente não dominam a fundo o tema (ou a especialidade) da pesquisa;
- não há a possibilidade de debate simultâneo com os julgadores nas 2 últimas instâncias (como em uma banca);
- a avaliação não é às cegas;
- elementos externos à instituição (avaliadores ad hoc, por exemplo) não são considerados.
A segunda ordem de problemas é de natureza burocrática. Tramitar um projeto (com análise de mérito) pelo colegiado do departamento, pelo conselho da faculdade e por uma das câmaras, na melhor das hipóteses (com uma combinação favorável de calendário e de relatores), leva, no mínimo, um mês. A UnB, tampouco dispõe de uma política de controle de projetos de pesquisa e a multiplicação das instâncias administrativas (definidas na IR 1/08) não possibilitará que isso ocorra, pelo contrário. Outras IES, ao contrário, há tempos têm desenvolvido políticas institucionais nessa direção, sem aumentar a tramitação. Um exemplo interessante é o da Universidade Estadual de Maringá (UEM), além de ter um controle efetivo dos projetos de pesquisa da instituição (acesse aqui o sistema de gestão de projetos) , regulamentou a matéria em uma norma bastante clara (acesse aqui a resolução 110/05 CEP-UEM). Aqui na UnB, a experiência da UEM já foi inspiradora para o relatório de uma comissão do Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação, que, infelizmente, não avançou (baixe aqui o relatório da comissão).
O terceiro ponto diz respeito à necessidade de se tornar a julgar o mérito de algo que já foi analisado (com muito mais isenção e competência) pelo financiador da pesquisa. Nesse sentido, o Art 11º da normatização da UEM é bem interessante ao definir que: "O projeto de pesquisa aprovado por agências financiadoras, ou ainda aprovado pelo colegiado de programa de pós-graduação, mediante comprovação, deve ser encaminhado ao departamento apenas para ciência" (destaquei). Isso significa que os projetos já aprovados por organizações sérias não serão julgados pela universidade, esta, porém terá controle de que ele está ocorrendo. Há que se definir quem tem o direito de julgar o que, caso contrário todas as condições para a criação de um pequeno tribunal universitário inquisitorial estarão dadas. O que será que o Santo Ofício achava da relevância acadêmica das pesquisas de Copérnico e Galileu?
Como funciona isso hoje na UnB? Não funciona. Não há nenhum banco de dados com os projetos docentes e nem o CDOC tem uma política de recolhimento sistemático de projetos e relatórios finais. A ausência de institucionalização da pesquisa docente gera problemas para para os programas de pós-graduação que têm docentes sem projetos aprovados por agências financiadoras, uma vez que o item "participação em projetos" é muito importante para a avaliação da CAPES e nem todos os professores conseguem "lattesjar" (clique aqui para entender o termo) devidamente suas pesquisas. É preciso que a institucionalização não seja confundida com avaliação de mérito.
Já vivenciei, em toda sua plenitude, os 3 tipos de problemas que apontei acima: análise de mérito indevida (do que já havia sido aprovado), excesso de burocracia e gestão documental descontrolada. Quando encerrei minhas atividades na UEM e, na sequência, tomei posse na UnB, eu coordenava um projeto do edital universal, do CNPq. Assim que comunicado sobre minha nova instituição, o CNPq preparou termo aditivo que foi, prontamente assinado pelo reitor da UEM. Aqui na UnB o aditivo tornou-se um processo. O processo foi para o Serviço de Convênios e Contratos (SCO), que o encaminhou à Procuradoria Jurídica (PJU). Detalhe: o projeto nunca envolveu nenhuma contrapartida da UnB e todas as despesas eram feitas diretamente por mim, sem envolvimento de nenhuma outra instância. O parecer da PJU foi negativo e afirmou que o projeto, pelo tema, não atendia aos interesses da FUB. A PJU questionou ainda a legalidade de um professor com Dedicação Exclusiva coordenar um projeto junto ao CNPq. Depois de 40 dias, com reuniões e tramitação de outros documentos, finalmente a UnB se dignou a assinar o termo aditivo do CNPq. Na ocasião, por garantia, fiz uma cópia xerox do processo todo. Tive também alguma dificuldade para encaminhar ao CNPq o termo original (já assinado por mim e pela UEM), uma vez que ele havia se tornado parte do processo. Foi difícil convencer o responsável de que ele deveria ser substituído por uma cópia. Após a finalização da transferência formal da pesquisa para a UnB, tentei, em vão, encaminhar uma cópia do novo termo, com todas as assinaturas, para ser anexado ao processo: A SCO não foi capaz de localizá-lo. Ainda hoje sigo sem notícia sobre o processo da SCO. O do CNPq está encerrado, com todos os relatórios aprovados e, de "tão irrelevante" que era, foi desdobrado como minha pesquisa de produtividade e aprovado pelo CNPq (que usa avaliação ad hoc às cegas para julgar o mérito). Quem quiser conhecer o nova pesquisa é só acessar o blog do Digifoto.
O blog Ciência Brasil, além de se posicionar quanto ao tema, disponibilizou os links aos documentos da UnB. Clique aqui para ter acesso aos documentos, além de poder ler uma outra opinião sobre o tema.
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