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domingo, 22 de julho de 2012

Contra a má vontade não há argumentos
A greve na universidade (ainda)...

Copiado de Rabix
Até quando se continuará a tentar tapar o Sol com a peneira? Lembro-me de, quando eu era pequeno, acompanhar minha mãe, professora da USP a uma manifestação (uma das primeiras do período de distensão da ditadura) de docentes da USP. Depois, como aluno daquela universidade, recordo-me de vários semestres alterados por conta de greves. Em 1994 comecei a lecionar no ensino superior e devo ter passado, desde então, mais de um ano (se formos somar os dias de paralisação) em greve. O triste é que, apesar da greve geralmente ter uma coloração avermelhada, os governos e gestores que insistem em nunca apontar para uma saída estrutural definitiva são de todas as cores e tendências. Hoje, quando a greve completou 62 dias, por acaso comentei, via G-talk, o fato com uma amiga minha, que é professora na Romênia. Ante a resposta dela ("- Again?") comecei a duvidar que algum dia o Brasil realmente tratará a Universidade pública com respeito e atitudes efetivas para sua inserção como protagonista em um projeto nacional. Ao que tudo indica o improvável estádio do Corinthians (com o qual eu sonhava, ouvindo as vãs promessas de sua edificação próxima, desde os idos de 1978, quando comecei a acompanhar minha mãe em manifestações na USP) será uma realidade bem antes da solução para o eterno problema da universidade pública brasileira.

Promessas não faltam, boas promessas midiáticas e falaciosas menos ainda. Recentemente, logo após o anúncio da proposta do governo (feita somente após 53 dias de greve) uma aluna minha me mandou uma mensagem pelo celular: "- Parabéns professor, o sr. irá ganhar 17 mil por mês e a greve vai acabar" (até parece! - educadamente respondi que só acreditava vendo). Entre a tola manipulação da opinião pública e a efetividade das propostas existe um abismo gigantesco. Recentes estudos da PROIFES mostram que a proposta do governo representa uma perda real de salário para a maioria dos níveis da carreira docente se for computada a inflação prevista até a conclusão do ajuste proposto.

Copiado de Jornalismo Ciência Ambiente
Não cabe aqui demonstrar por "A+B" o absurdo da proposta do governo, já que a razoabilidade esperada há muito tornou-se inexistente. Mentir e manipular para obter interesses específicos, infelizmente, faz parte do atual jogo político. A coisa é bem mais grave se aquele que mente e tenta manipular acredita que ao repetir ad nauseam a mesma ladainha ela se tornará realidade; deveria ser tratada como patologia a partir do momento em que o mitômano começa a realmente crer na sua própria história, em seus próprios argumentos. E, a quem ousar desafiar tais verdades, anunciando que "- O Rei está nu!", recomenda-se, enfaticamente, o corte de ponto, por crime de lesa pátria.

Frei Betto, homem que costumava ser visto pelos petistas como exemplo de ética e justeza, publicou na semana passada um diálogo imaginário (em minha opinião) que teve com um alto representante do governo atual, em um encontro fortuito no aeroporto, sobre a greve da universidades. A cada argumento esdrúxulo de seu colega o escritor rebatia com a lógica evidenciando os absurdos de posições falsamente justificadas em "contigência orçamentária", "necessidade de investimentos mais produtivos", "avanços na imagem do país" com a copa do mundo, "nível de remuneração do serviço público" etc. Ao se despedir, seu amigo reconhece a mais cruel das verdades: "- O problema, companheiro, é que, por estar no governo, não posso criticá-lo. Mas você tem boa dose de razão".
  • Não deixe de ler a íntegra do texto de Frei Betto aqui (não deixe de ler mesmo!)
  • Leia aqui post anterior sobre a greve atual
  • Veja aqui relação  de posts anteriores sobre a UnB e greves pregressas.

4 comentários:

  1. Há muito jogo de cena, tanto do lado dos grevistas quanto do lado do Governo. Fica difícil se fazer um juízo adequado de valor sobre o tema. Entendo que o
    jogo de interesses dos dois lados fala mais alto que a vontade real de atacar o problema da educação de frente. Países que pegaram a "doença" da educação, como a Coréia (do sul é claro), Singapura e China, só para citar três exemplos, estão "nadando de braçada". Por aqui as coisas andam mal. Há vagas para emprego no mercado de trabalho, porém exigem qualificação. Como se
    qualifica pessoas? Com educação. O diálogo do Frei Beto, provavelmente
    com ele mesmo, deixa a gente com aquela sensação estranha, não sabe se
    ri ou se chora.

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    1. Paulo, independentemente dos jogos de interesse e do interlocutor do Frei Betto, o seu comentário mostra bem qual é o ponto central: "vontade real de atacar o problema da educação de frente". Sem isso a coisa realmente não vai andar. Hoje li a nova proposta do governo. É bem melhor que a primeira, mas não muda estruturalmente nada, apenas cria paliativos que empurram parte do problema de fundo mais para frente e ignoram completamente outras questões cruciais. Há tempos a universidade vai se nutrindo de paliativos e empurrando as coisas com a barriga. Combate-se os sintomas mas não as causas e quando o efeito do paliativo cessa, inicia-se outra greve e, de crise em crise, a gente vai andando para trás, se consolidando como foco de excelência no 3º mundo, em uma tímida zona de conforto para os limitados anseios de nossa elite nacional.

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    2. Paulo Argolo

      Aliás essa é a tônica desse governo e das gestões anteriores de Lula. Não são formuladas políticas de longo prazo para nenhum setor do país, quer seja a educação quer seja a economia, por exemplo. Tem uma piada que diz o seguinte: um sujeito se ausenta do Brasil por 30 dias e quando volta se surpreende com a quantidade de ações empreendidas e medidas tomadas pelo governo, contudo esse mesmo sujeito sai se afasta do Brasil por 15 anos e quando volta percebe que está tudo igual, ou seja, os problemas continuam os mesmos. Infelizmente esse mesmo cenário ocorre também na UnB, convivemos com um monte de "mesmos problemas" há anos.

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  2. Desculpe. O comentário acima é meu (Paulo Argolo).

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